segunda-feira, 7 de março de 2011

O cheiro do colega e os banheiros da Austrália


Só eu tinha conhecimento desse caso. Prefiro não falar o nome do protagonista para evitar constrangimentos, mas vale o relato.

O colega meu, esse do caso sobre o qual vou falar, é um tanto estranho. Para falar a verdade, ele é bem esquisito. Ele é daquele tipo quieto. Discreto porém engraçado. Daqueles que dão vontade de ficar olhando só para observar as estranhices que farão. O colega, esse, não é daqueles que despertam o sentimento de pena, afinal é inteligente e bem quisto por todos. Na verdade, não sei se mais alguém repara nas suas peculiaridades tanto quanto eu.

O fato é que o colega fedia. Ele cheirava levemente mal quando circulava pelos corredores. Às vezes, o odor nem era tão leve. Eu já sabia inclusive o motivo, mas os colegas sequer haviam percebido a origem do fedor.

No começo do curso, ele chegava nas aulas sem odores, mas o fedor aumentava com o decorrer da manhã. Algumas semanas depois, o cheiro chegava à escola junto com ele, despertando o olfato dos colegas. As pessoas estranhavam aquele fedor e ficavam cheirando as próprias roupas para terem certeza de que não eram a fonte do aroma. Depois de um mês, ele ainda não havia solucionado o problema. Talvez nem tivesse se dado conta.

A verdade é que ele fedia a banheiro, eufemisticamente falando. Mais diretamente, o odor lembrava o que há nos toaletes, o que se faz lá.

Sempre que vou ao banheiro, o colega está por lá, assoando o nariz, usando o mictório, lavando as mãos, se olhando no espelho ou saindo do vaso sanitário. Desde o primeiro dia eu havia reparado nisso. 

Como eu achava interessante reparar no jeitão estranho dele, não demorei para perceber que ele estava de olho na turca da minha turma, a Gulin. Boa escolha.

Tímido, talvez tivesse dificuldades para se aproximar, mas tentou. Nos intervalos, se juntava no mesmo círculo de Gulin e lançava olhares e sorrisos, sem grande eficiência. Certo dia eu entrei no banheiro para lavar o rosto e tentar acordar. Eu estava quase me retirando quando ouvi um cochicho.

- Hoje eu vou conversar em particular com ela. Hoje ela me conhecerá de verdade. Vou me abrir para ela! - era ele, dentro da cabine do sanitário falando para si. Reconheci os tenis e as calças abaixadas por baixo da porta.

Desisti de sair do banheiro. Mais do que nunca, ele precisava de auxílio naquele momento e só eu poderia ajudar.

Tudo começou no primeiro dia de aula (ele iniciou o curso junto comigo). Eu presenciei a primeira ocorrência do problema. Eu estava lavando as mãos no banheiro quando ele saiu da cabine com cara de dúvida e com papel higiênico usado na mão. Olhava ao redor procurando algo até que desistiu. Pôs o papel no bolso e saiu. Eu demorei para acreditar. Ele usara aquele papel antes de colocar no bolso! Ele não havia encontrado lixeira no banheiro e preferiu levar o que havia usado no bolso a encontrar outra maneira de abandoná-lo.

Aquela atitude se repetiu. Admito que vi aquilo ocorrer outras vezes e me senti constrangido para intervir. Sinto-me um tanto culpado por não ter explicado ao colega como proceder com o resultado da higienização pessoal posterior ao ato íntimo de produzir os excessos do processo de nosso sistema digestivo. O pior é que havia dias em que ele esquecia de depositar o papel higiênico usado em alguma lixeira. Assim, o colega chegava a passar a manhã toda com o troço no bolso, por isso o cheiro se tornava permanente em suas roupas.

No entanto, eu não deixaria aquilo ir adiante. Não seria por culpa minha que ele fracassaria com a garota de quem gostava. Esperei ele sair da cabine para falar o que eu sempre havia evitado.

- Oi! Você puxou a descarga? - tive que improvisar, não sabia como dizer sem deixá-lo constrangido.
- Puxei, algum problema? - perguntou tímido. 

Surpreendentemente o cheiro habitual não o acompanhava naquela manhã. Pelo contrário, estava cheirando muito bem até. No entanto ele segurava o papel na mão, pronto para por no bolso e, mais tarde (sabe-se lá depois de quanto tempo), ele colocaria em alguma lixeira.

 - É que esse sanitário que você usou está estragado. Na verdade é só uma das descargas que não está funcionando, justamente a que usamos quando deixamos o papel higiênico. Ah, agora vi que você está com o papel na mão. Põe ali na outra privada e aperta o botão da direita. Nesse vaso o botão da descarga para papel higiênico está funcionando - inventei que estava estragado e tentei deixar claro que havia descargas diferentes.
- Como assim descarga para papel higiênico? - perguntou ingenuamente.
- É que aqui na Austrália não se usa lixeira nos banheiros, o sistema de descarga é dividido em dois. Um é mais forte que o outro, para puxar o papel higiênico e o conteúdo mais denso, entende? Por isso sempre tem dois botões. Nos nossos países consideramos errado colocar papel, mas aqui é assim que funciona - tentei ser didático.
- Ah... - falou com cara de surpresa.

Pronto, estava explicado. Ele pensou um pouco, jogou o papel na privada, puxou a descarga e saiu com seu andar estranho em direção às mesas onde estava Gulin. Sentou e conversou sem muita desenvoltura. Tentei me aproximar para tentar ouvir e ver se daria certo. Talvez eu fosse o responsável pelo sucesso do mais novo casal do curso. Escutei a conversa por uns cinco minutos.

- Não posso ir à praia nessa semana. Tenho que trabalhar - afirmou a bela Gulin no final dos cinco minutos - De qualquer modo não seria legal, meu namorado ficaria com ciúmes - a turca voltou à aula.

Ao menos o colega nunca mais guardou papeis higiênicos usados nos bolsos.

 
Curiosidade: equipamento que encontro em alguns banheiros (principalmente de shoppings) que vendem, por $2, produtos como desodorante, camisinha, curativo e algumas coisas para melhorar o hálito.
 

8 comentários:

  1. Colocar no bolso voi la, até da pra imaginar o problema é na hora de tirar, com a fragilidade do papel e a umidade do produto...
    Eca!!
    RR

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  2. HeuHEuEHEUh....
    Historia engraçada man...
    HEuehUh....
    massa...

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  3. hOIUAEHAEIUHEAOIAEHIUEA

    INACREDITAVEL

    não é possível ter gente assim

    rolei aqui..

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  4. Cara que história!Só um lugar com um mix cultural tão grande pode nos proporcionar isto rsrs.

    Como sempre ótimo post Daniel agora sei que quando chegar nas Aus e me deparar com banheiro de duas descargas não vou colocar papel no bolso kkkkkkk.

    Curiosidade do dia: Coloca pra gnt uma foto da turca ;)

    Abraços e continue postando, muito bom seu blog

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  5. William, obrigado pelo comentario. Eh bom alertar para esse tipo de coisa ne, vai saber do que as pessoas sao capazes... heheh

    A turca nao ia gostar muito de ter uma foto publicada, nem o namorado iria aprovar. essa vou ficar devendo.

    Abracao!

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  6. Oi Dani.
    Sensancional, adorei.
    Agora fala sério, isto sim é o que eu chamo de solidareidade masculina....rsrsr.
    Um abraço.

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  7. Quase não, é inacreditavel mesmo! Demais pra mim.

    Como pode uma coisa dessas... ?!?!

    Esse menino tem me*** na cabeça? Não, no bolso mesmo. kkkk...

    Lorena.

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  8. Ouwn que coisa mais fofa o q tu fez por esse ser.. pálmas
    não sabia se ria ou chorava, mas vc foi super delicado na maneira de falar.. adorei!!!

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