O trabalho e a mudança de endereço tem intensificado minha rotina. Não poder me distrair e não ter muitos momentos de lazer nos últimos dias foi inevitável. Gosto de viver novidades, mas de um modo que eu possa respirar. Não posso reclamar, pois a mudança é válida, mas faltava-me tempo para descanso e, infelizmente, para o blog. Eu não vinha tendo disponibilidade alguma para ler meus livros ou revistas de turismo (as quais vem alimentando a minha ânsia por viajar). O bom é poder saborear as novidades. No meu caso, é ainda melhor poder dividí-las. A maior delas, o novo apartamento, não pode ser esquecido no retorno da breve pausa da escrita.
Faz parte da passagem de todo mundo que se muda para outro país. Ao menos uma vez, a moradia é novidade. Uma grande alteração na minha rotina aconteceu na última segunda-feira, quando tive de matar aula para arrumar as coisas antes de me mudar para o miolo de Sydney, o amontoado de prédios da city. Limpar banheiro e cozinha, aspirar o carpete e lavar a roupa de cama é obrigação quando se deixa uma casa. Cumprir a regra é assegurar de que o dinheiro pago na chegada à antiga residência (o bond ou cheque-caução) seja devolvido, mas, sobretudo, é questão de bom senso com aqueles com quem você compartilhou a residência. Feita a limpeza, é hora de juntar tudo, arrumar as malas e partir.
Em uma noite, fui apresentado aos meus novos companheiros de apartamento e conheci um pouco de suas histórias. Quatro franceses, um colombiano e um turco dividem hoje a casa comigo. Em breve, alguns deles sairão dando lugar a três brasileiros. A rotatividade dos flatmates é alta. Sejam quem forem, temos de nos adaptar aos hábitos deles. Dividir geladeira sem espaços específicos, não andar pela casa com calçados, preservar a privacidade dos outros e avisar a quando for ocupar o banheiro ou a máquina de lavar roupa para ver se alguém já estava esperando são algumas das coisas que devemos fazer para que a convivência seja agradável. Eu, no entanto, parecia fazer de tudo para começar com o pé esquerdo.
Fui direto até quarto usando tênis, acordei o francês da cama ao lado, esqueci meu telefone na cama (onde ele ficou tocando insistentemente), troquei os nomes franceses inúmeras vezes e tomei o suco do colombiano pensando que era meu. Tudo isso na primeira noite.
O constrangimento em cada pequeno vacilo foi inevitável, mas a cada erro desses, eu pedia desculpa e perguntava como eles costumavam fazer as coisas no apartamento. Admiravelmente educados e prestativos, pareciam compreender e não se importar com os equívocos iniciais. Explicaram tudo o que eu precisava saber e se prontificaram a auxiliar com o que eu precisasse. No final da noite, sentamos à mesa e jantamos juntos. Sempre muito atenciosos, procuraram me conhecer e saber sobre o Brasil e sobre a minha passagem pela Austrália. Como que sem lembrar das situações embaraçosas que eu havia criado, contaram suas histórias e suas vidas em Sydney. Apesar de tudo, a chegada ao novo apartamento não parecia poder ser melhor. Um dos motivos da mudança parecia já estar funcionando, foram horas de conversa sem uma palavra em português.
Entrar na intimidade das pessoas é um grande aprendizado. Ouvir o relato de um colombiano sobre as dificuldades da sua rotina com três empregos diários e da sua relação com uma namorada australiana vivendo do outro lado do país é como ler um livro ou ver um filme contado pessoalmente pelo personagem. Escutar a história de um viajante francês que conheceu toda a costa dos Estados Unidos antes de vir à Oceania não é menos interessante. Pareço ter reencontrado o tempo para o lazer e descoberto concorrência para os livros e as revistas de turismo.
quarta-feira, 30 de março de 2011
segunda-feira, 21 de março de 2011
O jornal gratuito e a conversa no trem
Nesta segunda-feira, Ignácio saiu cedo do trabalho. Com a chuva insistente dos últimos dias, apenas oito clientes foram jantar no restaurante em que ele trabalha. Às 21h, o garoto estava liberado. Sentia-se satisfeito por voltar para casa antecipadamente, mas a noite parecia poder melhorar ainda mais.
Ele segurava o Mx, jornal gratuito distribuído de segunda a sexta nas estações de trem. Estudei sobre esse tipo de publicação na faculdade. No Brasil, a cultura dos jornais gratuitos não pegou. Em outros países eles são comuns, principalmente nos meios de transportes. É o caso da Austrália, ou pelo menos de Sydney, com o Mx. A ideia é lucrar apenas com a publicidade, mas é importante que o jornal circule, não sendo lido por apenas uma pessoa. A intenção é que o ele não vá para o lixo depois de ser lido, o leitor deve apenas deixar o jornal em algum local para que, mais tarde, outra pessoa pegue para ler. O problema do Mx é o conteúdo. Ele trata basicamente de celebridades e curiosidades sem grande relevância. Tudo bem que a intenção é entreter quem está voltando para casa à tarde, após trabalho ou estudo, mas a solução para distrair os leitores poderia ser encontrada de maneira mais útil. Ignácio pegou o jornal quando sentou no trem. Na sua frente, uma australiana.
Sem trocar palavra alguma, ele reconheceu: aquela era uma típica aussie. Ele estuda as australianas desde que chegou. É encantado por elas. De fato, elas são demais. 75% delas seguem um padrão de beleza. No máximo, as garotas dessa taxa variam em apenas uma das suas características. Olhos azuis, pele bronzeada, corpo sempre em forma e os cabelos, loiros. Não é apenas isso que se tem para falar a respeito dos cabelos delas. O estilo das madeixas douradas é único, o que faz a minha preferência pelas morenas ser momentaneamente deixada de lado nessas terras. Parece que andam pelas ruas da maneira que levantaram da cama. Não se preocupam em dar forma ao cabelo e desfilam daquele modo. Pode parecer estranho para algumas pessoas, mas para mim e para o Ignácio isso dá um ar irresistível de naturalidade. Ignácio diz se sentir como que acordando ao lado delas quando se aproxima de belas cabeleiras despenteadas. As garotas dos outros 25% não são bonitas, talvez descendentes de povos muito distintos.
O caso é que a garota, que estava de acordo com todos os requisitos das aussies e usando um vestido colado e curtíssimo (como é de costume por aqui), estava olhando para Ignácio. Por cima das folhas do Mx, ele via a garota o observando. Ignácio, conhecedor das atitudes femininas, interpretou o olhar dela como sendo de quem pensava: "vou olhar para ele de maneira que seja discreta, mas que ele perceba para eu ver se ele corresponde". Analisando a situação desse modo, Ignácio endireitou sua postura, certificou-se que seu cabelo estava como deveria, cruzou as pernas com um ar de segurança e retribuiu o olhar. Passadas duas estações, os olhos já haviam se cruzado inúmeras vezes. Não havia tempo para esperar, ela poderia descer nas próximas estações e em seguida ele chegaria ao seu destino. Ignácio deveria agir para alcançar seu objetivo, sair com uma australiana. É bem verdade que ele já havia tido um encontro bem sucedido com uma bela aussie. Aquela do trem, no entanto, não era morena. Seria sua primeira australiana legítima!
North Sydney Station. Ela não desceu. A sorte parecia estar do seu lado. Aquela era a hora, uma parada mais longa. Ele teria tempo de se aproximar e improvisar um papo. Assim que o trem voltou a se deslocar, ele sentou ao lado da garota.
- Olá. Você é australiana, não é? - Ignácio iniciou.
- Sou sim, e você? - o tom sem grande interesse inibiu Ignácio.
- Eu não... - respondeu, perdendo a segurança.
- Então de onde é? - perguntou surpreendentemente impaciente.
- Sou do Brasil - tenso, teve de fazer uma pausa para pensar no improviso - Na verdade eu cheguei há poucas semanas aqui e não conheço muito da cidade, então resolvi perguntar se você tem tempo para dar uma volta por aí um dia desses.
- Tenho sim - Ela respondeu em um tom ainda mais sério. Toda a confiança natural do galanteador havia desaparecido, apesar de ela responder positivamente. A loira demonstrava total desinteresse, sequer havia olhado para ele durante o diálogo. Acima de tudo, Ignácio estava confuso com a reação da garota.
- Então o que você acha de deixar o número do seu celular comigo para a gente marcar alguma coisa, talvez conhecer um restaurante diferente? - Ignácio sabia que poderia estar sendo direto demais, mas não encontrou nada melhor para falar. Ele estava desconfortável, estranhando o diálogo. Porém ainda havia alguma chance; ela havia olhado demais para ele.
- Eu disse que eu tenho tempo para sair, mas não disse que quero gastar esse tempo contigo! - finalmente a australiana havia olhado para Ignácio. No entanto, ele preferia não ter sido alvo daquele olhar. A aussie havia mirado o garoto com uma expressão de superioridade e um tanto de desprezo.
- Mas... - Sem saber o que fazer com tanto constrangimento, Ignácio tinha vontade de pular nos trilhos. Sentia-se realmente inferior sem entender o que se passava - Mas eu achei que você estava me olhando...
- Eu estava esperando você largar o jornal, já que não estava lendo. Esta é a minha estação. Deixe-me ir. Agora posso finalmente ler? - falou arrancando o jornal de Ignácio sem esperar permissão.
Sem trocar palavra alguma, ele reconheceu: aquela era uma típica aussie. Ele estuda as australianas desde que chegou. É encantado por elas. De fato, elas são demais. 75% delas seguem um padrão de beleza. No máximo, as garotas dessa taxa variam em apenas uma das suas características. Olhos azuis, pele bronzeada, corpo sempre em forma e os cabelos, loiros. Não é apenas isso que se tem para falar a respeito dos cabelos delas. O estilo das madeixas douradas é único, o que faz a minha preferência pelas morenas ser momentaneamente deixada de lado nessas terras. Parece que andam pelas ruas da maneira que levantaram da cama. Não se preocupam em dar forma ao cabelo e desfilam daquele modo. Pode parecer estranho para algumas pessoas, mas para mim e para o Ignácio isso dá um ar irresistível de naturalidade. Ignácio diz se sentir como que acordando ao lado delas quando se aproxima de belas cabeleiras despenteadas. As garotas dos outros 25% não são bonitas, talvez descendentes de povos muito distintos.
O caso é que a garota, que estava de acordo com todos os requisitos das aussies e usando um vestido colado e curtíssimo (como é de costume por aqui), estava olhando para Ignácio. Por cima das folhas do Mx, ele via a garota o observando. Ignácio, conhecedor das atitudes femininas, interpretou o olhar dela como sendo de quem pensava: "vou olhar para ele de maneira que seja discreta, mas que ele perceba para eu ver se ele corresponde". Analisando a situação desse modo, Ignácio endireitou sua postura, certificou-se que seu cabelo estava como deveria, cruzou as pernas com um ar de segurança e retribuiu o olhar. Passadas duas estações, os olhos já haviam se cruzado inúmeras vezes. Não havia tempo para esperar, ela poderia descer nas próximas estações e em seguida ele chegaria ao seu destino. Ignácio deveria agir para alcançar seu objetivo, sair com uma australiana. É bem verdade que ele já havia tido um encontro bem sucedido com uma bela aussie. Aquela do trem, no entanto, não era morena. Seria sua primeira australiana legítima!
North Sydney Station. Ela não desceu. A sorte parecia estar do seu lado. Aquela era a hora, uma parada mais longa. Ele teria tempo de se aproximar e improvisar um papo. Assim que o trem voltou a se deslocar, ele sentou ao lado da garota.
- Olá. Você é australiana, não é? - Ignácio iniciou.
- Sou sim, e você? - o tom sem grande interesse inibiu Ignácio.
- Eu não... - respondeu, perdendo a segurança.
- Então de onde é? - perguntou surpreendentemente impaciente.
- Sou do Brasil - tenso, teve de fazer uma pausa para pensar no improviso - Na verdade eu cheguei há poucas semanas aqui e não conheço muito da cidade, então resolvi perguntar se você tem tempo para dar uma volta por aí um dia desses.
- Tenho sim - Ela respondeu em um tom ainda mais sério. Toda a confiança natural do galanteador havia desaparecido, apesar de ela responder positivamente. A loira demonstrava total desinteresse, sequer havia olhado para ele durante o diálogo. Acima de tudo, Ignácio estava confuso com a reação da garota.
- Então o que você acha de deixar o número do seu celular comigo para a gente marcar alguma coisa, talvez conhecer um restaurante diferente? - Ignácio sabia que poderia estar sendo direto demais, mas não encontrou nada melhor para falar. Ele estava desconfortável, estranhando o diálogo. Porém ainda havia alguma chance; ela havia olhado demais para ele.
- Eu disse que eu tenho tempo para sair, mas não disse que quero gastar esse tempo contigo! - finalmente a australiana havia olhado para Ignácio. No entanto, ele preferia não ter sido alvo daquele olhar. A aussie havia mirado o garoto com uma expressão de superioridade e um tanto de desprezo.
- Mas... - Sem saber o que fazer com tanto constrangimento, Ignácio tinha vontade de pular nos trilhos. Sentia-se realmente inferior sem entender o que se passava - Mas eu achei que você estava me olhando...
- Eu estava esperando você largar o jornal, já que não estava lendo. Esta é a minha estação. Deixe-me ir. Agora posso finalmente ler? - falou arrancando o jornal de Ignácio sem esperar permissão.
sexta-feira, 18 de março de 2011
De mudança
A gente pensa muito quando está longe de casa. Ao menos eu penso demais por aqui. Em um desses dias em que não parava de refletir, troquei uma ideia com o Nick antes de dormir. Cada um na sua cama deitado, por volta de duas da manhã. Eu sabia que ele ainda não dormia. Talvez estivesse fazendo qustionamentos como eu.
- Às vezes tu não achas que a vida parece muito instável por aqui? Sei que a gente veio para simular o início de uma vida que é de verdade, não estou reclamando (até gosto disso), mas é estranho estar morando em um lugar com gente diferente, sem saber se vai trocar de casa nas próximas semanas. A gente trabalha em um local pensando que pode trocar de emprego em alguns dias caso apareça outra oportunidade em uma área em que tu nunca te imaginaste trabalhando. E o curso, são cinco meses de aula, mas e depois? Temos de decidir entre estender o visto e voltar. É tudo temporário - falei.
Esse foi o início da conversa que duraria até as quatro da manhã. Um dos principais tópicos foi a respeito dos objetivos da vinda para cá. Queremos aprender inglês, ganhar dinheiro e uma série de coisas, mas, sobretudo, viemos para viver experiências. Entre a diversão e o aprendizado do inglês, o que seria a prioridade? Não podemos escolher apenas um, mas morar com os amigos, por exemplo, é optar pela diversão e deixar o inglês mais de lado do que deveríamos. Assim tem sido. Se eu trabalhasse em um local onde não se fala português, eu ainda teria o idioma mais presente.
- Acho que seria bom eu me mudar. Não viemos para cá para conviver com brasileiros no curso, no trabalho e em casa. Sendo que vejo vocês todos na aula quase diariamente. Também é importante conhecer gente de outros lugares - falei.
- É, por mais que a gente viva ouvindo inglês e frequente o curso, poderíamos aproveitar mais a língua. O ideal seria morarmos próximos uns dos outros ou ter vários gringos em casa. Não precisamos necessariamente estar todos juntos - Nick comentou.
No dia seguinte eu falava sobre o mesmo assunto com Hakan, um colega turco.
- Se você quer mudar em outro bairro e sem brasileiros, você devia ver o meu apartamento. Tem um francês saindo em duas semanas - contou Hakan.
Depois daquela mesma aula, fui com ele até o apartamento. Fica na Pitt Street, uma das principais ruas de Sydney, próxima do meu trabalho, no núcleo da cidade. Se ainda não achei nada na praia, não haveria outro local mais interessante para morar. Primeiro, Hakan me apresentou o mais interessante, as piscinas e a academia. Ele realmente queria preencher logo a vaga e daquele jeito estava conseguindo me vender a ideia. Subimos até o trigésimo andar do prédio que parecia perfeito para mim. O apartamento é bom e moderno, mas bagunçado. São nove estudantes morando lá, três franceses, um turco e um colombiano. Entre as gurias, são duas francesas, uma alemã e uma japonesa. Lamentei a notícia de que elas vão embora, mas novas garotas devem chegar para preencher as vagas do quarto feminino.
Avaliei as diferenças e conclui que valia a pena. Moraria longe dos meus amigos, mas nao deixaria de vê-los. Dividiria um apartamento com muita gente, mas não me importo tanto com organização e seria uma boa oportunidade para fazer amigos. Pagaria vinte dólares a mais, mas pouparia tempo em deslocamento e teria algumas regalias. Claro que também havia a vantagem de praticar o inglês.
Dia 28 estarei me mudando. Isso significa muito, quase tudo vai mudar na minha rotina. Estou ansioso para conhecer aqueles que vão morar comigo. Em Porto Alegre, nunca tive a experiência de me mudar (nem desejei ter). Em menos de três meses, já morei em mais lugares do que em 20 anos. É a vida imprevisível que temos aqui. Gosto disso.
- Às vezes tu não achas que a vida parece muito instável por aqui? Sei que a gente veio para simular o início de uma vida que é de verdade, não estou reclamando (até gosto disso), mas é estranho estar morando em um lugar com gente diferente, sem saber se vai trocar de casa nas próximas semanas. A gente trabalha em um local pensando que pode trocar de emprego em alguns dias caso apareça outra oportunidade em uma área em que tu nunca te imaginaste trabalhando. E o curso, são cinco meses de aula, mas e depois? Temos de decidir entre estender o visto e voltar. É tudo temporário - falei.
Esse foi o início da conversa que duraria até as quatro da manhã. Um dos principais tópicos foi a respeito dos objetivos da vinda para cá. Queremos aprender inglês, ganhar dinheiro e uma série de coisas, mas, sobretudo, viemos para viver experiências. Entre a diversão e o aprendizado do inglês, o que seria a prioridade? Não podemos escolher apenas um, mas morar com os amigos, por exemplo, é optar pela diversão e deixar o inglês mais de lado do que deveríamos. Assim tem sido. Se eu trabalhasse em um local onde não se fala português, eu ainda teria o idioma mais presente.
- Acho que seria bom eu me mudar. Não viemos para cá para conviver com brasileiros no curso, no trabalho e em casa. Sendo que vejo vocês todos na aula quase diariamente. Também é importante conhecer gente de outros lugares - falei.
- É, por mais que a gente viva ouvindo inglês e frequente o curso, poderíamos aproveitar mais a língua. O ideal seria morarmos próximos uns dos outros ou ter vários gringos em casa. Não precisamos necessariamente estar todos juntos - Nick comentou.
No dia seguinte eu falava sobre o mesmo assunto com Hakan, um colega turco.
- Se você quer mudar em outro bairro e sem brasileiros, você devia ver o meu apartamento. Tem um francês saindo em duas semanas - contou Hakan.
Depois daquela mesma aula, fui com ele até o apartamento. Fica na Pitt Street, uma das principais ruas de Sydney, próxima do meu trabalho, no núcleo da cidade. Se ainda não achei nada na praia, não haveria outro local mais interessante para morar. Primeiro, Hakan me apresentou o mais interessante, as piscinas e a academia. Ele realmente queria preencher logo a vaga e daquele jeito estava conseguindo me vender a ideia. Subimos até o trigésimo andar do prédio que parecia perfeito para mim. O apartamento é bom e moderno, mas bagunçado. São nove estudantes morando lá, três franceses, um turco e um colombiano. Entre as gurias, são duas francesas, uma alemã e uma japonesa. Lamentei a notícia de que elas vão embora, mas novas garotas devem chegar para preencher as vagas do quarto feminino.
Avaliei as diferenças e conclui que valia a pena. Moraria longe dos meus amigos, mas nao deixaria de vê-los. Dividiria um apartamento com muita gente, mas não me importo tanto com organização e seria uma boa oportunidade para fazer amigos. Pagaria vinte dólares a mais, mas pouparia tempo em deslocamento e teria algumas regalias. Claro que também havia a vantagem de praticar o inglês.
Dia 28 estarei me mudando. Isso significa muito, quase tudo vai mudar na minha rotina. Estou ansioso para conhecer aqueles que vão morar comigo. Em Porto Alegre, nunca tive a experiência de me mudar (nem desejei ter). Em menos de três meses, já morei em mais lugares do que em 20 anos. É a vida imprevisível que temos aqui. Gosto disso.
quinta-feira, 17 de março de 2011
O verde irlandês e as verduras chinesas
Day off para mim e Nick no trabalho. Resolvemos conhecer a Chinatown, famosa pelos preços baixos, já havíamos adiado demais esse passeio. Saímos no início da tarde.
Sabíamos que Chinatown ficava perto da Central Station, mas descemos em Town Hall e fomos caminhando. Estranhamos a quantidade de pessoas vestindo roupas verdes pelo caminho. Os pubs estranhamente estavam todos cheios, coloridos de verde e com bandeiras da Irlanda penduradas por todo lado. Tive de matar a curiosidade. Encontrei três garotas irlandesas vestidas a carater. Não haveria ninguém melhor para perguntar.
- Hoje é dia de São Patrício, o padroeiro da nossa Irlanda. A gente se encontra em pubs para comemorar bebendo - explicou a encantadora ruivinha de olhos azuis.
A Irlanda é responsável por grande parte dos imigrantes na Austrália. Por isso a movimentação era tão intensa e esverdeada na cidade para comemorar esse dia. Também deu para entender a maneira como a data é celebrada, os irlandeses tem muita fama de beberem demais. Aliás, a maior parte dos pubs é de origem irlandesa.
Continuamos o nosso caminho à Chinatown. Haviam nos avisado que era fácil de chegar. Seguimos as indicações. Descemos a George Street em direção à central station e dobramos à direita na Hay Street. Quando percebemos, parecíamos estar em Xangai.
Circulamos por algumas ruas e vimos todo tipo de loja chinesa, mas queríamos achar o tal mercado. Aqui em Sydney, frutas e verduras são muito caras. Se há alguma maneira de manter uma alimentação completa e saudável sem gastar muito dinheiro, é comprando naquela feira da qual ouvimos falar.
- Market City! Pode ser ali! - falei ao Nick, apontando para um grande prédio.
Descemos alguns degraus e entramos no Market City. Era um camelódromo, como os do Brasil. Ainda não havíamos visto algo assim por aqui. Era imenso. Ziguezagueamos pelas dezenas de corredores entre roupas, chapéus, brinquedos, malas... Todos produtos eram chineses e baratos, muito baratos! Uma mala como essas que usamos para trazer nossas coisas estava sendo vendida por 25 dólares. Brincamos por uns minutos com um grande helicóptero com controle remoto que voa a 35 metros de distância e que estava a venda por 40 dólares.
No entanto, ainda não havia sinal de fruta ou verdura alguma. Pedimos informações. Falaram para irmos até o final do camelódromo e dobrarmos à direita.
Caminhávamos por mais alguns corredores e o cheiro de verduras aumentava. Entramos em outra área. Um outro ambiente se formava, era a feira, finalmente. 'Um dólar, um dólar' gritavam os vendedores para atrair clientes. Ficamos muito entusiasmados com os preços. Sabíamos que deveríamos comer salada e frutas com mais frequência. Apenas agora, porém, poderíamos nos alimentar sem pensarmos no volume de nossas carteiras.
Percorremos os corredores dando uma olhada no que era oferecido. Encontramos os mesmos produtos dos supermercados por menos da metade do preço. Tudo era muito barato. Havia ainda as promoções das promoções, verdadeiras liquidações. Os vendedores colocam algumas cestinhas sobre as mesas com porções de tomates, laranjas, maçãs, peras, melões, cenouras ou qualquer outra coisa pelo preço de um dólar. Quase tudo o que levei estava nessas promoções. Comprei oito maçãs grandes, um pacote com mixed salad (salada com vários tipos de verdura misturados, que custa uns quatro dólares no supermercado) suficiente para umas três refeições e três cachos grandes de uva verde. Cada um desses itens me custou um dólar. Ainda comprei limões amarelos, doze por dois reais. No total, gastei 5 dólares e saí de lá com quatro sacolas. Quase compramos uma melancia por $1,20, mas seria complicado voltar carregando tudo.
Sabíamos que Chinatown ficava perto da Central Station, mas descemos em Town Hall e fomos caminhando. Estranhamos a quantidade de pessoas vestindo roupas verdes pelo caminho. Os pubs estranhamente estavam todos cheios, coloridos de verde e com bandeiras da Irlanda penduradas por todo lado. Tive de matar a curiosidade. Encontrei três garotas irlandesas vestidas a carater. Não haveria ninguém melhor para perguntar.
- Hoje é dia de São Patrício, o padroeiro da nossa Irlanda. A gente se encontra em pubs para comemorar bebendo - explicou a encantadora ruivinha de olhos azuis.
A Irlanda é responsável por grande parte dos imigrantes na Austrália. Por isso a movimentação era tão intensa e esverdeada na cidade para comemorar esse dia. Também deu para entender a maneira como a data é celebrada, os irlandeses tem muita fama de beberem demais. Aliás, a maior parte dos pubs é de origem irlandesa.
Pub irlandês |
Irlandesas e eu |
Circulamos por algumas ruas e vimos todo tipo de loja chinesa, mas queríamos achar o tal mercado. Aqui em Sydney, frutas e verduras são muito caras. Se há alguma maneira de manter uma alimentação completa e saudável sem gastar muito dinheiro, é comprando naquela feira da qual ouvimos falar.
- Market City! Pode ser ali! - falei ao Nick, apontando para um grande prédio.
Descemos alguns degraus e entramos no Market City. Era um camelódromo, como os do Brasil. Ainda não havíamos visto algo assim por aqui. Era imenso. Ziguezagueamos pelas dezenas de corredores entre roupas, chapéus, brinquedos, malas... Todos produtos eram chineses e baratos, muito baratos! Uma mala como essas que usamos para trazer nossas coisas estava sendo vendida por 25 dólares. Brincamos por uns minutos com um grande helicóptero com controle remoto que voa a 35 metros de distância e que estava a venda por 40 dólares.
No entanto, ainda não havia sinal de fruta ou verdura alguma. Pedimos informações. Falaram para irmos até o final do camelódromo e dobrarmos à direita.
Caminhávamos por mais alguns corredores e o cheiro de verduras aumentava. Entramos em outra área. Um outro ambiente se formava, era a feira, finalmente. 'Um dólar, um dólar' gritavam os vendedores para atrair clientes. Ficamos muito entusiasmados com os preços. Sabíamos que deveríamos comer salada e frutas com mais frequência. Apenas agora, porém, poderíamos nos alimentar sem pensarmos no volume de nossas carteiras.
Percorremos os corredores dando uma olhada no que era oferecido. Encontramos os mesmos produtos dos supermercados por menos da metade do preço. Tudo era muito barato. Havia ainda as promoções das promoções, verdadeiras liquidações. Os vendedores colocam algumas cestinhas sobre as mesas com porções de tomates, laranjas, maçãs, peras, melões, cenouras ou qualquer outra coisa pelo preço de um dólar. Quase tudo o que levei estava nessas promoções. Comprei oito maçãs grandes, um pacote com mixed salad (salada com vários tipos de verdura misturados, que custa uns quatro dólares no supermercado) suficiente para umas três refeições e três cachos grandes de uva verde. Cada um desses itens me custou um dólar. Ainda comprei limões amarelos, doze por dois reais. No total, gastei 5 dólares e saí de lá com quatro sacolas. Quase compramos uma melancia por $1,20, mas seria complicado voltar carregando tudo.
As cestinhas por $1 |
O rancho do Nick foi ainda maior. Mesmo assim, ainda tínhamos de passar em um supermercado para completar as compras. Fomos ao Woolworths, concorrente do Coles. Aproveitei para comparar os preços das frutas e verduras. Lembrei da cestinha de maçãs, das melancias e dos melões inteiros por um dólar e tive que registrar a diferença...
Potinhos com pedaços de melão e melancia |
Não sei quanto era a amora na feira, mas fiquei impressionado com o preço no supermercado, pricipalmente com o que cobram pelo quilo. |
terça-feira, 15 de março de 2011
Uma manhã entre coalas e cangurus
Cada segunda-feira, uma turma da escola tem passeio marcado. Nesta semana, foi a vez de eu e meus colegas saírmos. Não cheguei a falar sobre isso, mas quando voltei a estudar no turno da manhã troquei de curso, voltei ao General English para mais futuramente me dedicar à prova do IELTS. Nesta segunda, portanto, nada de estudar verbos, expressões ou textos. Passaríamos a manhã vendo os animais típicos da Austrália no Koala Park. Após quase três meses em Sydney, eu ainda não havia visto um marsupial sequer.
Dizem que ver cangurus e coalas é obrigação para quem vem à Austrália. Não gosto desse tipo de colocação encontradas em "manuais de viajantes". Pior é quando se ouve algo do tipo: 'Como é que você foi a Paris e não entrou no Louvre?' Se não há curiosidade para ir a determinados lugares e conhecer alguma peculiaridade do destino, não há motivo real para aderir a esse tipo de exigência. Discutimos isso na aula alguns dias atrás. Há aquelas pessoas que se importam demais em tirar fotos e sentem necessidade de estar no registro. Tem gente que vem a Sydney e fica mais tempo vendo o Opera House pela tela da câmera do que a olho nu. Não seria mais interessante viver e sentir o momento? Não sou contrário à fotografia. Ando sempre com minha câmera (mais em função do blog), mas penso que a melhor recordação que podemos guardar fica na memória.
Aquela manhã era algo que eu queria registrar. Tinha muito interesse de conhecer os tão diferentes animais. A minha câmera estava sem bateria, então pedi para usar o equipamento de uma colega e garantir algumas imagens para o blog. Pegamos um trem e um ônibus até chegarmos ao Koala Park.
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Advanced in Koala Park |
Todos estavam ansiosos para ver o coala, menos eu, que me interesso mais pelos cangurus. Porém, os animais que avistamos primeiro foram os da ala das aves.
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Cockatoos (cacatua). Típicos também da Austrália, podemos ver esses pássaros sobre os postes de energia nas ruas. |
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Pavão (peacock) |
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Pinguim (penguin) |
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Segundo a colega turca, o galo era um animal incrível. Inacreditável era o quanto ela havia se impressonado com aquele galo. |
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Dingo |
Por mim poderia demorar, queria era ver os cangurus. Passamos por mais alguns animais que estavam dormindo dentro de suas jaulas e por outros que não ganhavam grande destaque, como morcegos enormes, que dormiam repugnantemente em suas asas peludas no fundo da jaula escura.
Íamos finalmente à área dos cangurus. Antes, no entanto, conhecemos um outro marsupial, menor mas quase tão interessante quanto o canguru. O wallaby.
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Wallaby |
- Podem entrar, vamos dar comida a eles - convidou entusiasmado.
Sem titubear, todos entramos na área dos cangurus com saquinhos de comida. Seria a primeira vez que os veria. Eram aqueles mesmo que eu enxergava na televisão. Quando chegamos, uns se assustaram e sairam pulando, outros vieram com fome e alguns sequer deram bola e ficaram deitados.
Um que estava deitado foi meu companheiro naquele momento. Sentei do lado e ofereci comida. Fique alimentando o bicho durante alguns minutos. Ele não havia levantado por preguiça, pois fome não faltava. A grande diferença de ver ao vivo é que torna-se possível sentir o bicho e suas reações. São, pelo menos os do zoológico, como cães ou gatos. Interagir com eles é conhecer sua personalidade. Essa era a grande experiência.
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Esse amigão aí era faminto. |
Sentei novamente e fiquei mais um tempo dando comida pra ele. Até que dei um último afago e tive de ir embora.
Estava na hora de ver os coalas. Uma pequena fila se formava para chegar perto do animal. Todos a postos para abraçar o coala e tirar uma foto agarrado nele. Realmente ele parece um bicho de pelúcia, tanto pela aparência quanto pela movimentação. Ele é considerado o bicho-preguiça da Austrália por se movimentar lentamente e viver agarrado nas árvores. Todos estavam dormindo nos galhos, ou pelo menos pareciam estar dormindo. Aprendi que a lentidão deles é devida à alimentação. Eles comem ervas que possuem uma grande quantidade de toxinas. Essas substâncias exigem um longo e intenso processo para serem digeridas no organismo dos coalas. Com essa exigência do sistema digestivo, eles poupam energia e ficam nessa moleza toda.
Não resisti e tive que abraçar o coala. Talvez ele nem se sentisse ou percebesse nada, tamanho era seu estado de sonolência. Juntei-me aos visitantes afoitos por uma foto. Naquele momento eu me tornava um daqueles turistas típicos obedecendo a ordem dos manuais. Nem me importei, pois aquilo realmente me animava. Talvez tenha me animado tanto com aquele animal que exagerei no abraço. Quando envolvi o coala ele se moveu, coisa rara no dia-a-dia deles. Fui capaz de fazer ele levantar a para e ameaçar dar um passo para frente para se desvencilhar do meu abraço. Fui alertado pela instrutora para apenas encostar. Tirei a foto, dei mais um afago e fui-me embora. Grande manhã!
Quem se interessar pode clicar no link para ver os detalhes do Koala Park.
sábado, 12 de março de 2011
A felicidade do lado bom da vida
Considero-me um cara sortudo. Percebo que as coisas acontecem quando tem que acontecer. Se algo dá errado, tenho confiança de que tudo se resolve em seguida. Claro que para isso normalmente tenho de me mexer. Se duas semanas atrás recebi a notícia de que a vaga que tentava não seria minha, hoje estou com um emprego que me satisfaz. Claro que o emprego não é a única coisa que interessa, mas era a única coisa que me faltava naquele momento.
Talvez a sorte dependa apenas do ponto de vista. Quem interpretar a minha rotina de outra maneira, pode pensar que não tenho como estar satisfeito. As coisas erradas, afinal, podem ser enxergadas acima das certas. Isso é o que faz muita gente se sentir infeliz sem motivos reais. Basta ver o mundo de maneira pessimista para desanimar, deixar de correr atrás do que quer e se sentir um infeliz. O otimismo me parece, portanto, o que possibilita a conquista da felicidade em todos os sentidos. Soa como texto de auto-ajuda, mas nada é tão rotineiro quanto questionamentos a respeito disso. Também parece que trato como se fosse algo fácil. Para mim, realmente não parece difícil, mas sei que pode não ser tão fácil assim. Pensei sobre isso na volta do trabalho, quando conversava com um colega.
- Estou folgando na quarta e na quinta. No outros dias eu trabalho - contei.
- Nossa! Que merda! Eu tenho namorada e já parece ser péssimo. Imagina se eu estivesse solteiro como você! Eu estararia entediado sem poder sair no final de semana - comentou o colega.
- Ah, estou na boa. Gosto do trabalho. Não seria por uma festa que tudo seria melhor. Tem várias maneiras de aproveitar - respondi.
Eu voltava tranquilo da churrascaria. Gosto de lá, das pessoas, da função e da comida. O deslocamento poderia ser uma chatice, mas aproveito o tempo para me distrair com música ou leitura quando não estou acompanhado por algum colega. Uma ou outra festa perdida não pioraria tudo.
A sorte esteve do meu lado quando esse trabalho apareceu. Na mesma semana em que comecei por lá, três funcionários voltaram para o Brasil. A chefe pediu que eu saísse da cozinha e trabalhasse como passador, servindo as carnes no espeto. Percebendo a vaga que sobrara na churrasqueira, me propus a aprender a função de assador. Afirmei que não tinha experiência, mas que se ela desse uma chance eu poderia ficar alguns dias aprendendo para ver se daria certo. Ela topou. Ser o assador de uma churrascaria é inegavelmente uma responsabilidade, ainda mais nos finais de semana, por isso o salário é melhor do que nas outras funções. Ainda estou aprendendo, mas tudo está correndo bem. Possivelmente logo poderei estar comandando a churrasqueira de sexta a domingo (segunda e terça sou passador).
Além da boa oportunidade, não tenho mais despesas com alimentação. Ao final de cada expediente, os funcionários podem se servir e levar comida para casa. Feijão, arroz e churrasco de qualidade voltaram a fazer parte do meu cardápio diário. Chego a levar o suficiente para três refeições. Não sei como funciona no Brasil, mas isso é muito normal por aqui e é a grande vantagem de trabalhar em restaurantes.
Outra coisa que rola muito na Austrália são as tips (gorjetas). É impressionante como os clientes contribuem com gorjetas. Em alguns restaurantes, os próprios garçons ficam com elas. Em outros, elas são divididas entre todos os funcionários, é o caso de onde trabalho. Hoje, a divisão das tips resultou em $25 extras para cada um. Está certo que esse sábado foi um dia atípico, mas normalmente recebemos mais de $10, um acréscimo interessante para quem não tem grandes gastos.
Como se já não bastasse a Cláudia, nossa colega de quarto que já trabalhava na churrascaria, o nosso amigo Leonel fez teste como passador e também está trabalhando conosco. Hoje era o Nick quem estava em teste lá como kitchen hand. Tudo correu bem e ele foi aceito. A partir dessa semana ele ira conciliar o tempo nos dois restaurantes em que trabalha. Trabalhando com amigos, que serviço fica ruim?
Voltando todos juntos de trem, conversávamos sobre tudo e nos divertíamos. Quando chegamos em casa, não havia ninguém. Reparamos na falta dos nossos amigos e lembramos que tinham uma festa para ir. No entanto, nem me importei. Não havia razão para reclamar, tive um bom sábado. Um sábado de trabalho, é verdade, mas com diversão, amigos, uma boa janta e a grana na carteira, afinal tive hoje o primeiro pagamento da churrascaria. Apesar de tudo isso, tem gente que reclamaria da vida, como aquele meu colega. Estava feliz. Tudo depende de ver o lado bom da vida.
Talvez a sorte dependa apenas do ponto de vista. Quem interpretar a minha rotina de outra maneira, pode pensar que não tenho como estar satisfeito. As coisas erradas, afinal, podem ser enxergadas acima das certas. Isso é o que faz muita gente se sentir infeliz sem motivos reais. Basta ver o mundo de maneira pessimista para desanimar, deixar de correr atrás do que quer e se sentir um infeliz. O otimismo me parece, portanto, o que possibilita a conquista da felicidade em todos os sentidos. Soa como texto de auto-ajuda, mas nada é tão rotineiro quanto questionamentos a respeito disso. Também parece que trato como se fosse algo fácil. Para mim, realmente não parece difícil, mas sei que pode não ser tão fácil assim. Pensei sobre isso na volta do trabalho, quando conversava com um colega.
- Estou folgando na quarta e na quinta. No outros dias eu trabalho - contei.
- Nossa! Que merda! Eu tenho namorada e já parece ser péssimo. Imagina se eu estivesse solteiro como você! Eu estararia entediado sem poder sair no final de semana - comentou o colega.
- Ah, estou na boa. Gosto do trabalho. Não seria por uma festa que tudo seria melhor. Tem várias maneiras de aproveitar - respondi.
Eu voltava tranquilo da churrascaria. Gosto de lá, das pessoas, da função e da comida. O deslocamento poderia ser uma chatice, mas aproveito o tempo para me distrair com música ou leitura quando não estou acompanhado por algum colega. Uma ou outra festa perdida não pioraria tudo.
A sorte esteve do meu lado quando esse trabalho apareceu. Na mesma semana em que comecei por lá, três funcionários voltaram para o Brasil. A chefe pediu que eu saísse da cozinha e trabalhasse como passador, servindo as carnes no espeto. Percebendo a vaga que sobrara na churrasqueira, me propus a aprender a função de assador. Afirmei que não tinha experiência, mas que se ela desse uma chance eu poderia ficar alguns dias aprendendo para ver se daria certo. Ela topou. Ser o assador de uma churrascaria é inegavelmente uma responsabilidade, ainda mais nos finais de semana, por isso o salário é melhor do que nas outras funções. Ainda estou aprendendo, mas tudo está correndo bem. Possivelmente logo poderei estar comandando a churrasqueira de sexta a domingo (segunda e terça sou passador).
Além da boa oportunidade, não tenho mais despesas com alimentação. Ao final de cada expediente, os funcionários podem se servir e levar comida para casa. Feijão, arroz e churrasco de qualidade voltaram a fazer parte do meu cardápio diário. Chego a levar o suficiente para três refeições. Não sei como funciona no Brasil, mas isso é muito normal por aqui e é a grande vantagem de trabalhar em restaurantes.
Outra coisa que rola muito na Austrália são as tips (gorjetas). É impressionante como os clientes contribuem com gorjetas. Em alguns restaurantes, os próprios garçons ficam com elas. Em outros, elas são divididas entre todos os funcionários, é o caso de onde trabalho. Hoje, a divisão das tips resultou em $25 extras para cada um. Está certo que esse sábado foi um dia atípico, mas normalmente recebemos mais de $10, um acréscimo interessante para quem não tem grandes gastos.
Como se já não bastasse a Cláudia, nossa colega de quarto que já trabalhava na churrascaria, o nosso amigo Leonel fez teste como passador e também está trabalhando conosco. Hoje era o Nick quem estava em teste lá como kitchen hand. Tudo correu bem e ele foi aceito. A partir dessa semana ele ira conciliar o tempo nos dois restaurantes em que trabalha. Trabalhando com amigos, que serviço fica ruim?
Voltando todos juntos de trem, conversávamos sobre tudo e nos divertíamos. Quando chegamos em casa, não havia ninguém. Reparamos na falta dos nossos amigos e lembramos que tinham uma festa para ir. No entanto, nem me importei. Não havia razão para reclamar, tive um bom sábado. Um sábado de trabalho, é verdade, mas com diversão, amigos, uma boa janta e a grana na carteira, afinal tive hoje o primeiro pagamento da churrascaria. Apesar de tudo isso, tem gente que reclamaria da vida, como aquele meu colega. Estava feliz. Tudo depende de ver o lado bom da vida.
sexta-feira, 11 de março de 2011
O álcool em Sydney
Toda quinta-feira é dia de homenagem no curso. Quem acaba os estudos na escola recebe o certificado e se despede em uma pequena cerimônia. Nesta semana, uma amiga pernambucana encerrava a sua passagem pela AIPE. Depois do tradicional momento posterior à aula, fomos todos convidados para ir a um bar vizinho à escola. Alguns de nós fomos, a maioria era brasileira.
A conversa girou em torno das diferenças entre Austrália e Brasil. Depois de alguns goles nas cervejas australianas, começaram as lástimas a respeito do valor das bebidas por aqui. O preço de um copo de cerveja em qualquer festa dificilmente é menor que $5.
O ideal é saber se divertir sem precisar tomar nada. No entanto, quem faz questão de dar uns goles durante a noite e evita gastar muito dinheiro costuma comprar cerveja para tomar em casa. A pena por ser flagrado bebendo em público é de pelo menos $200. Nos supermercados também não podemos encontrar bebidas, pois os estabelecimentos que vendem esses produtos (mesmo os restaurantes) não podem sequer receber menores de idade. Os locais onde as bebidas são vendidas são as Bottle Shops. Mesmo com a rigidez das leis relacionadas ao consumo de álcool na Austrália, é muito comum ver jovens embriagados durante a noite nas ruas e estações de trem.
O lugar mais barato que conhecemos em Sydney é o Bar Century , que fica na esquina da Liverpool com a George Street no mesmo prédio do Hungry Jacks. Lá a cerveja custa $3. O principal motivo para quem gosta de entrar no Bar Century é mesmo o preço, pois o som não é dos melhores. Normalmente quem frequenta o Century, vai logo em seguida para o Three Wise Monkeys, que fica na esquina em frente, onde o ambiente e a música são bem melhores e a entrada é gratuita.
Como a despedida era de uma pernambucana, resolvemos ir a um forró. Estranho pensar em uma festa de forró em Sydney, mas havia um naquela noite. Antes, passamos no Century para aqueles que achavam importante comprar cerveja. Foi lá que começou a noite de Ignácio.
- Preciso me animar depois de um dia tão cansativo. Com $9 eu compro três aqui. Em qualquer outro lugar eu não conseguiria comprar nem duas - afirmou animado.
Ignácio gastou $12. Depois de um tempo no Century, finalmente fomos a Kings Cross. O forró seria no Hugos. Era uma noite brasileira, com apresentação de grupo de samba e dançarinas com fantasias de carnaval. A diversão foi grande, mas Ignácio se empolgou mesmo quando descobriu que vendiam Skol lá.
- Cara, sei que já tomei umas lá no Century e que já estou legal, mas Skol aqui é raridade - explicou antes de ir ao bar - Não vou deixar passar essa oportunidade.
Voltei com Dudi e Murillo para perto das colegas. Aproveitamos por mais de meia-hora, quando encontramos Ignácio sentado à mesa com uma garrafa de Skol.
- Ignácio, você está bem? - perguntei.
- Sim. Estou mais do que bem. Matei a saudade do Brasil. Toda a saudade do Brasil inteiro! - falou já bastante alterado.
- Cara, olha o seu estado! Quantas você comprou? Como vai voltar até a sua casa assim? - questionei ao ver ele falar todo torto.
- Não consigo olhar meu estado, ao menos que tu me mostre um espelho! - Ignácio falou antes de cair em gargalhadas. Esperei ele parar de rir e explicar - Ah, fui tomando com o pessoal do curso, nem sei quantas foram. Mas sei como vou voltar pra casa. Esses australianos são muito criativos! Olha aqui - falou me mostrando uma plaquinha que estava sobre a mesa - Aliás, eles até já chegaram. Até mais, Dani! Fui!
Ele desceu as escadas cambaleando e subiu na garupa de uma moto. Fiquei lendo a placa que ele tinha me mostrado.
A conversa girou em torno das diferenças entre Austrália e Brasil. Depois de alguns goles nas cervejas australianas, começaram as lástimas a respeito do valor das bebidas por aqui. O preço de um copo de cerveja em qualquer festa dificilmente é menor que $5.
O ideal é saber se divertir sem precisar tomar nada. No entanto, quem faz questão de dar uns goles durante a noite e evita gastar muito dinheiro costuma comprar cerveja para tomar em casa. A pena por ser flagrado bebendo em público é de pelo menos $200. Nos supermercados também não podemos encontrar bebidas, pois os estabelecimentos que vendem esses produtos (mesmo os restaurantes) não podem sequer receber menores de idade. Os locais onde as bebidas são vendidas são as Bottle Shops. Mesmo com a rigidez das leis relacionadas ao consumo de álcool na Austrália, é muito comum ver jovens embriagados durante a noite nas ruas e estações de trem.


Como a despedida era de uma pernambucana, resolvemos ir a um forró. Estranho pensar em uma festa de forró em Sydney, mas havia um naquela noite. Antes, passamos no Century para aqueles que achavam importante comprar cerveja. Foi lá que começou a noite de Ignácio.
- Preciso me animar depois de um dia tão cansativo. Com $9 eu compro três aqui. Em qualquer outro lugar eu não conseguiria comprar nem duas - afirmou animado.
Ignácio gastou $12. Depois de um tempo no Century, finalmente fomos a Kings Cross. O forró seria no Hugos. Era uma noite brasileira, com apresentação de grupo de samba e dançarinas com fantasias de carnaval. A diversão foi grande, mas Ignácio se empolgou mesmo quando descobriu que vendiam Skol lá.
- Cara, sei que já tomei umas lá no Century e que já estou legal, mas Skol aqui é raridade - explicou antes de ir ao bar - Não vou deixar passar essa oportunidade.
Voltei com Dudi e Murillo para perto das colegas. Aproveitamos por mais de meia-hora, quando encontramos Ignácio sentado à mesa com uma garrafa de Skol.
- Ignácio, você está bem? - perguntei.
- Sim. Estou mais do que bem. Matei a saudade do Brasil. Toda a saudade do Brasil inteiro! - falou já bastante alterado.
- Cara, olha o seu estado! Quantas você comprou? Como vai voltar até a sua casa assim? - questionei ao ver ele falar todo torto.
- Não consigo olhar meu estado, ao menos que tu me mostre um espelho! - Ignácio falou antes de cair em gargalhadas. Esperei ele parar de rir e explicar - Ah, fui tomando com o pessoal do curso, nem sei quantas foram. Mas sei como vou voltar pra casa. Esses australianos são muito criativos! Olha aqui - falou me mostrando uma plaquinha que estava sobre a mesa - Aliás, eles até já chegaram. Até mais, Dani! Fui!
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segunda-feira, 7 de março de 2011
O cheiro do colega e os banheiros da Austrália
Só eu tinha conhecimento desse caso. Prefiro não falar o nome do protagonista para evitar constrangimentos, mas vale o relato.
O colega meu, esse do caso sobre o qual vou falar, é um tanto estranho. Para falar a verdade, ele é bem esquisito. Ele é daquele tipo quieto. Discreto porém engraçado. Daqueles que dão vontade de ficar olhando só para observar as estranhices que farão. O colega, esse, não é daqueles que despertam o sentimento de pena, afinal é inteligente e bem quisto por todos. Na verdade, não sei se mais alguém repara nas suas peculiaridades tanto quanto eu.
O fato é que o colega fedia. Ele cheirava levemente mal quando circulava pelos corredores. Às vezes, o odor nem era tão leve. Eu já sabia inclusive o motivo, mas os colegas sequer haviam percebido a origem do fedor.
No começo do curso, ele chegava nas aulas sem odores, mas o fedor aumentava com o decorrer da manhã. Algumas semanas depois, o cheiro chegava à escola junto com ele, despertando o olfato dos colegas. As pessoas estranhavam aquele fedor e ficavam cheirando as próprias roupas para terem certeza de que não eram a fonte do aroma. Depois de um mês, ele ainda não havia solucionado o problema. Talvez nem tivesse se dado conta.
A verdade é que ele fedia a banheiro, eufemisticamente falando. Mais diretamente, o odor lembrava o que há nos toaletes, o que se faz lá.
Sempre que vou ao banheiro, o colega está por lá, assoando o nariz, usando o mictório, lavando as mãos, se olhando no espelho ou saindo do vaso sanitário. Desde o primeiro dia eu havia reparado nisso.
Como eu achava interessante reparar no jeitão estranho dele, não demorei para perceber que ele estava de olho na turca da minha turma, a Gulin. Boa escolha.
Tímido, talvez tivesse dificuldades para se aproximar, mas tentou. Nos intervalos, se juntava no mesmo círculo de Gulin e lançava olhares e sorrisos, sem grande eficiência. Certo dia eu entrei no banheiro para lavar o rosto e tentar acordar. Eu estava quase me retirando quando ouvi um cochicho.
- Hoje eu vou conversar em particular com ela. Hoje ela me conhecerá de verdade. Vou me abrir para ela! - era ele, dentro da cabine do sanitário falando para si. Reconheci os tenis e as calças abaixadas por baixo da porta.
Desisti de sair do banheiro. Mais do que nunca, ele precisava de auxílio naquele momento e só eu poderia ajudar.
Tudo começou no primeiro dia de aula (ele iniciou o curso junto comigo). Eu presenciei a primeira ocorrência do problema. Eu estava lavando as mãos no banheiro quando ele saiu da cabine com cara de dúvida e com papel higiênico usado na mão. Olhava ao redor procurando algo até que desistiu. Pôs o papel no bolso e saiu. Eu demorei para acreditar. Ele usara aquele papel antes de colocar no bolso! Ele não havia encontrado lixeira no banheiro e preferiu levar o que havia usado no bolso a encontrar outra maneira de abandoná-lo.
Aquela atitude se repetiu. Admito que vi aquilo ocorrer outras vezes e me senti constrangido para intervir. Sinto-me um tanto culpado por não ter explicado ao colega como proceder com o resultado da higienização pessoal posterior ao ato íntimo de produzir os excessos do processo de nosso sistema digestivo. O pior é que havia dias em que ele esquecia de depositar o papel higiênico usado em alguma lixeira. Assim, o colega chegava a passar a manhã toda com o troço no bolso, por isso o cheiro se tornava permanente em suas roupas.
No entanto, eu não deixaria aquilo ir adiante. Não seria por culpa minha que ele fracassaria com a garota de quem gostava. Esperei ele sair da cabine para falar o que eu sempre havia evitado.
- Oi! Você puxou a descarga? - tive que improvisar, não sabia como dizer sem deixá-lo constrangido.
- Puxei, algum problema? - perguntou tímido.
Surpreendentemente o cheiro habitual não o acompanhava naquela manhã. Pelo contrário, estava cheirando muito bem até. No entanto ele segurava o papel na mão, pronto para por no bolso e, mais tarde (sabe-se lá depois de quanto tempo), ele colocaria em alguma lixeira.
- Como assim descarga para papel higiênico? - perguntou ingenuamente.
- É que aqui na Austrália não se usa lixeira nos banheiros, o sistema de descarga é dividido em dois. Um é mais forte que o outro, para puxar o papel higiênico e o conteúdo mais denso, entende? Por isso sempre tem dois botões. Nos nossos países consideramos errado colocar papel, mas aqui é assim que funciona - tentei ser didático.
- Ah... - falou com cara de surpresa.
Pronto, estava explicado. Ele pensou um pouco, jogou o papel na privada, puxou a descarga e saiu com seu andar estranho em direção às mesas onde estava Gulin. Sentou e conversou sem muita desenvoltura. Tentei me aproximar para tentar ouvir e ver se daria certo. Talvez eu fosse o responsável pelo sucesso do mais novo casal do curso. Escutei a conversa por uns cinco minutos.
- Não posso ir à praia nessa semana. Tenho que trabalhar - afirmou a bela Gulin no final dos cinco minutos - De qualquer modo não seria legal, meu namorado ficaria com ciúmes - a turca voltou à aula.
Ao menos o colega nunca mais guardou papeis higiênicos usados nos bolsos.
Curiosidade: equipamento que encontro em alguns banheiros (principalmente de shoppings) que vendem, por $2, produtos como desodorante, camisinha, curativo e algumas coisas para melhorar o hálito. |
domingo, 6 de março de 2011
A Parada Gay de Sydney
Ignácio negou até o último instante, mas cedeu. Ele iria conosco à parada gay de Syndey, chamada aqui de Mardi Gras. O nome vem do francês (significa terça-feira gorda, devido a uma celebração com comida farta que ocorria na noite anterior de uma quarta-feira específica para os franceses). A cidade inteira se mobilizava para o evento que ocorreria nesse sábado. Neste ano, o movimento visou promover o apoio ao casamento entre homossexuais. Gays, lésbicas, simpatizantes, heteros e curiosos em geral estariam presentes, mas Ignácio dizia que não era lugar para ele.
- Eu vou, mas não tenho nada a ver com esse movimento, vou para acompanhar vocês. E nem venham tirar fotos minhas! Aliás, eu serei o fotógrafo de hoje, Dani - afirmou, pegando a câmera da minha mão.
Ignácio nunca gostou de ser fotografado. No entanto, naquele momento, especificamente, não aceitaria correr risco algum de ter sua presença registrada. Todos sabemos que o nosso amigo não é preconceituoso, bem como todos nós, mas ele sempre sente necessidade de manter sua postura de machão pegador e galanteador.
- Mesmo lá eu provarei a minha capacidade de conquista. Até no meio da parada gay eu posso pegar mulher. Mulher de verdade, querem ver?
Chegamos ao Hyde Park, onde começava a concentração para a Mardi Gras. Foi lá onde a nossa diversão teve início. Figuras engraçadíssimas se exibiam esbanjando alegria. As cores do arco-íris superavam o verde das árvores. Pessoas de todos tipos, etnias e idades estavam presentes tirando fotos e rindo. Após receber algumas orientações, nosso fotógrafo do dia conseguiu obter alguns registros interessantes.
Apesar de Ignácio tentar se mostrar contrariado, pudemos ver alguns sorrisos no seu rosto. Ele também estava achando tudo aquilo um tanto divertido. Porém, apenas nós conseguimos entrar na brincadeira.
Depois do parque, seguimos o fluxo da multidão, que se encaminhava à região onde ocorreria a parada, Darlinghurst, área muito frequentada pelo público gay. A avenida em que ocorreria a parada é a mesma sobre a qual falei no post do meu primeiro teste de trabalho, Oxford Street. É lá onde trabalho atualmente. Tudo estava fechado por causa da Mardi Gras. Por isso eu estava de folga.
Ainda era dia e cada vez mais gente chegava. O caminho começava a ficar apertado para tanta gente. A estimativa, ainda não confirmada, é de que 300 mil pessoas estiveram presentes. Chegamos tarde demais para conseguir um lugar próximo da avenida. Enquanto a música rolava e as pessoas aplaudiam, nós buscávamos alguma brecha no meio do público para ver o que se passava no asfalto da Oxford. Tarefa difícil.
Apenas com a chegada da noite conseguimos alcançar as grades que separavam os espectadores da avenida. A chuva fininha também ajudou a dispersar algumas pessoas da beira da Oxford. Depois de tomar algumas cervejas, Ignácio já não se preocupava mais com as fotos. O interesse estava completamente voltado para as garotas. Era a oportunidade que tínhamos de registrar o que rolava na avenida. Após alguma insistência minha, ele deu uns poucos flashaços do desfile, mas sem muito sucesso.
- É o seguinte, o importante é não se enganar - aconselhou Ignácio - Tem muita mulher que parece mulher, mas que um dia já foi rapaz. Eu já sei como diminuir a chance de erros, temos de tentar conversar com as mais novas, pois, quanto mais jovens, menos tempo tiveram de fazer todas as alterações, entendem? As mais velhas já mudaram muito e ninguém quer correr riscos, certo?
Apesar dos goles a mais que Ignácio já havia bebido, a teoria dele fazia sentido. A dificuldade que tínhamos de identificar a verdadeira identidade de algumas pessoas era um verdadeiro desafio. No entanto, ninguém estava dando muita bola para o que nosso amigo dizia. Até que ele, de repente, ele aparece com um grupo de amigas. Conhecíamos a capacidade que Ignácio tinha de se enturmar e conhecer garotas, mas estávamos surpresos. Em poucos minutos, estávamos todos juntos, conversando e rindo. Todas eram australianas com cerca de 20 anos. A tática havia dado certo. Grande Ignácio!
Passamos o resto da noite nos divertindo com elas. Estavam extremamente entusiasmadas com o fato de sermos brasileiros. Tudo o que falávamos do Brasil era o máximo para aquelas australianas. A alegria da noite só aumentaria dali em diante.
Assim como muitos daqueles que foram à Mardi Gras, Ignácio finalmente sorria sem se importar para o que os outros pensavam. Ele, é claro, feliz por estar acompanhado pelas garotas.
- Eu vou, mas não tenho nada a ver com esse movimento, vou para acompanhar vocês. E nem venham tirar fotos minhas! Aliás, eu serei o fotógrafo de hoje, Dani - afirmou, pegando a câmera da minha mão.
Ignácio nunca gostou de ser fotografado. No entanto, naquele momento, especificamente, não aceitaria correr risco algum de ter sua presença registrada. Todos sabemos que o nosso amigo não é preconceituoso, bem como todos nós, mas ele sempre sente necessidade de manter sua postura de machão pegador e galanteador.
- Mesmo lá eu provarei a minha capacidade de conquista. Até no meio da parada gay eu posso pegar mulher. Mulher de verdade, querem ver?
Chegamos ao Hyde Park, onde começava a concentração para a Mardi Gras. Foi lá onde a nossa diversão teve início. Figuras engraçadíssimas se exibiam esbanjando alegria. As cores do arco-íris superavam o verde das árvores. Pessoas de todos tipos, etnias e idades estavam presentes tirando fotos e rindo. Após receber algumas orientações, nosso fotógrafo do dia conseguiu obter alguns registros interessantes.
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As primeiras figuraças que encontramos chamando atenção de australianos |
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Patriotas pelo movimento |
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Eu falei, gente de todas etnias e idades. |
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Nudismo = Igualdade + liberdade |
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Essa não... |
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Essa era de verdade |
Ainda era dia e cada vez mais gente chegava. O caminho começava a ficar apertado para tanta gente. A estimativa, ainda não confirmada, é de que 300 mil pessoas estiveram presentes. Chegamos tarde demais para conseguir um lugar próximo da avenida. Enquanto a música rolava e as pessoas aplaudiam, nós buscávamos alguma brecha no meio do público para ver o que se passava no asfalto da Oxford. Tarefa difícil.
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Em direção à avenida |
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A multidão começava a aumentar |
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O público tentava se aproximar do desfile |
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Apesar dos goles a mais que Ignácio já havia bebido, a teoria dele fazia sentido. A dificuldade que tínhamos de identificar a verdadeira identidade de algumas pessoas era um verdadeiro desafio. No entanto, ninguém estava dando muita bola para o que nosso amigo dizia. Até que ele, de repente, ele aparece com um grupo de amigas. Conhecíamos a capacidade que Ignácio tinha de se enturmar e conhecer garotas, mas estávamos surpresos. Em poucos minutos, estávamos todos juntos, conversando e rindo. Todas eram australianas com cerca de 20 anos. A tática havia dado certo. Grande Ignácio!
Passamos o resto da noite nos divertindo com elas. Estavam extremamente entusiasmadas com o fato de sermos brasileiros. Tudo o que falávamos do Brasil era o máximo para aquelas australianas. A alegria da noite só aumentaria dali em diante.
Assim como muitos daqueles que foram à Mardi Gras, Ignácio finalmente sorria sem se importar para o que os outros pensavam. Ele, é claro, feliz por estar acompanhado pelas garotas.
quarta-feira, 2 de março de 2011
Problemas?
- Olha, se pudesse eu voltaria hoje para o Brasil.
- Por que, está difícil de encontrar emprego, falta grana?
- Não, moro com meus tios aqui, nem preciso trabalhar. Mas não estou gostando.
- Mas tu tem amigos, pessoas para se divertir?
- Isso eu tinha no Brasil. Isso e muito mais coisa.
- Muito mais o quê?
- Ah, cansa ficar falando inglês a toda hora, não ter meu carro, ajudar em casa. Essas coisas eu não precisava fazer.
Em parte de uma breve conversa de elevador com um colega, conheci o caso de alguém que não quer ficar. Não está se divertindo. Se arrependeu.
Refleti sobre aqueles motivos e imaginei que nem todas pessoas tem o perfil para fazer uma viagem dessas. Pensei um pouco mais e concluí que, na verdade, talvez nem todos estejam prontos para isso. A perda do conforto é uma consequência inevitável. Passar por dificuldades também. Dependendo das condições e dos objetivos, até se pode vir e passar todo o tempo com mordomias, gastando dinheiro, curtindo todo o tempo com praias e festas. No entanto, se essa não é a intenção, a pessoa tem que estar pronta para uma experiência não tão fácil, o que não significa pior, muito pelo contrário.
O problema do colega talvez seja a falta de vontade de passar por desafios. Experiências! Essa é a palavra que resume. O bom é vir para buscar experiência. Cada roupa que esquecemos durante dias no varal por não termos nossos pais para recolher, cada currículo entregue na rua, cada pessoa completamente estranha que divide um quarto com você, cada macarrão preparado, cada ônibus errado em que se entra, cada atraso, cada despedida de amigas europeias, cada problema com o dono da acomodação ou com o diretor da escola, cada não em entrevistas de emprego ou em cantadas nas russas... Tudo é experiência. Muitos nunca lidaram sozinhos com coisa alguma dessas. Resolver isso em um lugar com outra língua e com outras culturas aumenta ainda mais esse desafio. Temos de experimentar! Só assim ficamos prontos para a próxima russa, pois elas gostam é de elogios, mais do que qualquer outra poderia gostar.
Tentei me fixar em alguns empregos, uns eu troquei por opção própria e outros escolheram meus concorrentes. Pois nesse domingo soube que perdi a vaga no Boost Juice. Havia gente falando para eu não ficar triste, querendo me apoiar. Legal, mas eu sabia que não seria um problemão. Não tinha motivo para eu me preocupar, eu já sabia como procurar emprego. Ter tranquilidade é saber lidar melhor com as situações e isso só vem depois que se experimenta.
Procurei, conversei, caminhei, ouvi música, joguei truco e cozinhei para meus amigos. Encontrei duas oportunidades. Dois dias depois, dois testes marcados.
Para terça-feira, tinha um teste de kitchen hand em uma churrascaria brasileira. Seria apenas às cinco da tarde. Até lá, teria três horas livres.
Fui até o restaurante para conferir o endereço e voltei a um parque que fica próximo de lá, o Hyde Park. Era lá onde eu esperaria. De calça e sapatos sociais, tirei o livro da mochila e a camiseta do corpo. Aquela sim seria a minha "pré-ocupação". Me acomodei no banco. Gosto de parques, são os melhores refúgios para grandes cidades. O Hyde é cercado por edifícios, mas não é difícil se esquecer disso quando a gente se vê em meio a centenas de árvores e mergulhado em uma boa leitura. Aproveitar o Hyde ou outros parques é um hábito muito bem explorado pelos australianos. Quem sabe passando no teste eu não me tornaria um grande adepto desse costume.
Não posso deixar de citar a perseguição que presenciei antes de me levantar. Um pássaro em voo rasante tentava alcançar algum animal que correu até entrar no meio de um arbusto. Aproximei-me para ver que bicho era. Olhei por entre as folhas e vi um coelho me encarando e mexendo o focinho. Depois daquilo, quase me convenci de que não estava mais no centro de Sydney.
No teste foi tudo bem, o clima e os colegas são legais, tem uma boa carga horária e oferece refeições para os funcionários. Ainda haveria mais um teste nesta quarta, mais uma churrascaria, por coincidência. Da mesma maneira, tudo correu bem. Gostei de ambas, mas optei pela primeira, que me aceitara logo de cara sem necessidade de um segundo dia de avaliação. Enfim, um emprego fixo. Problemas resolvidos. Basta tentar, manter a calma e enfrentar cada caso para procurar a melhor maneira de solucionar as situações.
Dois dias atrás, queimou a lâmpada do banheiro. Tem gente que reclama toda hora disso e se recusa a usar esse banheiro durante a noite. Meus banhos noturnos ficaram melhores. Aprendi a curtir tomar banho no escuro, foi uma experiência no mínimo agradável. Por que não seria bom? Não precisa viajar pra isso nem esperar a lâmpada queimar para ter uma pequena nova experiência. Aposto que o colega brasileiro não tentaria.
- Por que, está difícil de encontrar emprego, falta grana?
- Não, moro com meus tios aqui, nem preciso trabalhar. Mas não estou gostando.
- Mas tu tem amigos, pessoas para se divertir?
- Isso eu tinha no Brasil. Isso e muito mais coisa.
- Muito mais o quê?
- Ah, cansa ficar falando inglês a toda hora, não ter meu carro, ajudar em casa. Essas coisas eu não precisava fazer.
Em parte de uma breve conversa de elevador com um colega, conheci o caso de alguém que não quer ficar. Não está se divertindo. Se arrependeu.
Refleti sobre aqueles motivos e imaginei que nem todas pessoas tem o perfil para fazer uma viagem dessas. Pensei um pouco mais e concluí que, na verdade, talvez nem todos estejam prontos para isso. A perda do conforto é uma consequência inevitável. Passar por dificuldades também. Dependendo das condições e dos objetivos, até se pode vir e passar todo o tempo com mordomias, gastando dinheiro, curtindo todo o tempo com praias e festas. No entanto, se essa não é a intenção, a pessoa tem que estar pronta para uma experiência não tão fácil, o que não significa pior, muito pelo contrário.
O problema do colega talvez seja a falta de vontade de passar por desafios. Experiências! Essa é a palavra que resume. O bom é vir para buscar experiência. Cada roupa que esquecemos durante dias no varal por não termos nossos pais para recolher, cada currículo entregue na rua, cada pessoa completamente estranha que divide um quarto com você, cada macarrão preparado, cada ônibus errado em que se entra, cada atraso, cada despedida de amigas europeias, cada problema com o dono da acomodação ou com o diretor da escola, cada não em entrevistas de emprego ou em cantadas nas russas... Tudo é experiência. Muitos nunca lidaram sozinhos com coisa alguma dessas. Resolver isso em um lugar com outra língua e com outras culturas aumenta ainda mais esse desafio. Temos de experimentar! Só assim ficamos prontos para a próxima russa, pois elas gostam é de elogios, mais do que qualquer outra poderia gostar.
Tentei me fixar em alguns empregos, uns eu troquei por opção própria e outros escolheram meus concorrentes. Pois nesse domingo soube que perdi a vaga no Boost Juice. Havia gente falando para eu não ficar triste, querendo me apoiar. Legal, mas eu sabia que não seria um problemão. Não tinha motivo para eu me preocupar, eu já sabia como procurar emprego. Ter tranquilidade é saber lidar melhor com as situações e isso só vem depois que se experimenta.
Procurei, conversei, caminhei, ouvi música, joguei truco e cozinhei para meus amigos. Encontrei duas oportunidades. Dois dias depois, dois testes marcados.
Para terça-feira, tinha um teste de kitchen hand em uma churrascaria brasileira. Seria apenas às cinco da tarde. Até lá, teria três horas livres.
Fui até o restaurante para conferir o endereço e voltei a um parque que fica próximo de lá, o Hyde Park. Era lá onde eu esperaria. De calça e sapatos sociais, tirei o livro da mochila e a camiseta do corpo. Aquela sim seria a minha "pré-ocupação". Me acomodei no banco. Gosto de parques, são os melhores refúgios para grandes cidades. O Hyde é cercado por edifícios, mas não é difícil se esquecer disso quando a gente se vê em meio a centenas de árvores e mergulhado em uma boa leitura. Aproveitar o Hyde ou outros parques é um hábito muito bem explorado pelos australianos. Quem sabe passando no teste eu não me tornaria um grande adepto desse costume.
Hyde Park e a belíssima e enorme catedral St Mary's |
Não posso deixar de citar a perseguição que presenciei antes de me levantar. Um pássaro em voo rasante tentava alcançar algum animal que correu até entrar no meio de um arbusto. Aproximei-me para ver que bicho era. Olhei por entre as folhas e vi um coelho me encarando e mexendo o focinho. Depois daquilo, quase me convenci de que não estava mais no centro de Sydney.
No teste foi tudo bem, o clima e os colegas são legais, tem uma boa carga horária e oferece refeições para os funcionários. Ainda haveria mais um teste nesta quarta, mais uma churrascaria, por coincidência. Da mesma maneira, tudo correu bem. Gostei de ambas, mas optei pela primeira, que me aceitara logo de cara sem necessidade de um segundo dia de avaliação. Enfim, um emprego fixo. Problemas resolvidos. Basta tentar, manter a calma e enfrentar cada caso para procurar a melhor maneira de solucionar as situações.
Dois dias atrás, queimou a lâmpada do banheiro. Tem gente que reclama toda hora disso e se recusa a usar esse banheiro durante a noite. Meus banhos noturnos ficaram melhores. Aprendi a curtir tomar banho no escuro, foi uma experiência no mínimo agradável. Por que não seria bom? Não precisa viajar pra isso nem esperar a lâmpada queimar para ter uma pequena nova experiência. Aposto que o colega brasileiro não tentaria.
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