domingo, 23 de outubro de 2011

A busca por emprego

Costumo chegar antes de todos os colegas no restaurante. Fico preparando as carnes da noite enquanto, do lado de fora, o dia vai chegando ao fim. Minha área de trabalho fica próxima à entrada. A porta de vidro é um bom recurso para quem quer ocupar um pouco mais a mente. Ao menos posso observar o movimento da rua entre um espeto e outro.

Com bastante frequência, batem na porta procurando emprego. Nessas horas quem está ali é eu; tenho que receber a pessoa, fazer perguntas básicas pra passar alguma informação à chefe e pegar o currículo. É uma situação que me deixa um tanto desconfortável, pois não posso solucionar o problema daquela pessoa. Ao menos, é uma oportunidade para tentar ajudar, mesmo que não haja vaga na churrascaria. Tento dar algum conselho ou indico outros estabelecimentos da redondeza que são novos e talvez estejam procurando pessoal. Normalmente são brasileiros recém chegados buscando o primeiro emprego onde não há tanta exigência em relação ao inglês. Acho importante questionar se realmente preferem um restaurante brasileiro. Para quem chegou há pouco tempo e não tem um inglês legal, pode ser bom no início, mas não vale a pena se acomodar nesses locais se a intenção é melhorar no idioma. Fazer um dinheirinho inicial é importante, tendo em vista o custo da vida em Sydney. Mas com o tempo, buscar algo que acrescente mais me parece a melhor atitude.

Naquele momento em que perguntam se há alguma vaga, sinto a insegurança da maioria que procura por emprego. O cara que está desse lado consegue medir algumas características da pessoa nas poucas palavras que troca com quem busca trabalho. Não sou especialista nisso, mas sinto que algumas mudanças nas atitudes dessas pessoas passariam uma imagem mais interessante para o empregador.

Lembro dos dois primeiros meses em que buscava emprego. Não é simples alguém pedir trabalho em uma função na qual não tem experiência. O ideal é tentar manter uma postura séria, passar a imagem de alguém responsável e seguro, mas nunca esquecendo a simpatia, o que é essencial, principalmente na área de hospitalidade. Não sei se eu conseguia me portar adequadamente quando pedia emprego, pois a insegurança e a vontade de conseguir logo uma vaga mexe um pouco com a firmeza da pessoa. Com a prática, entretanto, tudo fica mais fácil. Depois de algumas portas fechadas, a conversa começa a ficar melhor e a chance aparece quando menos se espera. Não é grande desafio nem motivo para dor de cabeça, mas ao mesmo tempo em que uns conseguem de primeira, outros podem levar algumas semanas a mais para ter sucesso.

Normalmente, quem manda e-mail perguntando sobre a vidaem Sydney traz essa questão: é muito difícil conseguir emprego? Sempre busco dar essas recomendações dos parágrafos anteriores e reforçar que raramente adianta ficar em casa e enviar dois currículos por semana pela internet. Sair às ruas e conversar com quem quer que seja nesses estabelecimentos amplia as oportunidades. Circular com 30 currículos na mão e conversar com 30 gerentes durante o dia sempre me parece mais eficaz. 

Andei presenciando casos em que pessoas vão acompanhadas de amigos ou namorados buscar emprego por não falarem um bom inglês. Nessas ocasiões, os amigos falam pelo candidato. Particularmente, creio que isso só atrapalha. A pessoa que, mesmo sem falar bem a língua, encara sozinha essas situações mostra muito mais personalidade e atitude. Se o inglês ainda não é dos melhores, ter na ponta da língua um pequeno texto que vá falar tudo que o gerente precisa ouvir me parece mais interessante. Apresente-se, diga o que você procura, mostre interesse, pergunte se há alguma oportunidade, agradeça pela atenção, entregue o currículo e coloque-se à disposição caso uma vaga apareça. Talvez o sim venha do trigésimo primeiro gerente.

Já fui aconselhado por muita gente, logo no início, a mentir no currículo, afirmando que havia trabalhado em restaurantes e bares no Brasil para ter mais chances de ser contratado. Também não apoio esse tipo de conselho. Prefiro dizer que estou disposto a aprender. Os poucos gerentes com quem convivi sabem que, normalmente, o pessoal com esse perfil de estudante intercambista nunca teve experiência no ramo. O empregador percebe, já no primeiro dia, que a pessoa não tem ideia de como se trabalha em um ambiente daqueles.


Eles estão acostumados a ter gente de fora trabalhando. Gente que vem de seus escritórios e faculdades na Europa, Ásia ou América para trabalhar como garçom, motorista, assistente de cozinha, babá... Uma pessoa sem experiência para eles não seria novidade. Seria mais uma a ser ensinada, nada ruim para eles desde que pareça responsável, interessado e simpático. Fazendo as coisas da maneira correta e se dispondo a encontrar algumas portas fechadas, as oportunidades aparecem.

Um comentário:

  1. Dani, quando li o texto passou um filme na minha cabeça. Pelo skype, diariamente, torcíamos para que todos vcs conseguissem emprego logo e cada vez que vinha a notícia que deu tudo certo ficávamos muito felizes. Não vou esquecer nunca da alegria de cada conquista de todos vcs.
    Estamos torcendo sempre e esperando a volta de vcs dois para completar a turma daqui.
    Bjs Regilove.

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